sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Resenha: O Massacre do Microondas (Microwave massacre)


Já se sentiu como se a vida estivesse tediosa e sem sabor? Sim? E o que você fez? Saiu para o shopping, comprou um acessório novo, trocou de amor? Então, o que achou? Isso resolveu? Não? Pois já pensou em assassinar alguém e se tornar um canibal homicida? Não? Pois Donald pensou. Prossiga e veja o que aconteceu com ele. 





Título original: Microwave massacre
Lançamento: 1983 (EUA)
Duração: 76 minutos
Direção: Wayne Berwick






“O massacre do microondas"
A estafa de um modo de vida que se esgota

Um caso curioso. O massacre do microondas (Microwave massacre) é sem dúvidas um filme horrível. Isso é obvio - lendo o título já é possível notar. Entretanto, se fizermos um (grande) esforço e olharmos além dos corpos decepados, das piadas prontas, das atuações medonhas das “atrizes” pornôs, da falta de uma trama minimamente estruturada, da ausência de proporção de tempo, do machismo, dos personagens mal trabalhados que nada acrescem a história, das obviedades, das atuações ruins, da trilha sonora fraca, dos estereótipos, dos figurinos cafonas, do final sem sentido - em suma: do fato de que o filme não merece mesmo ser assistido, encontraremos algumas sutilezas interessantes que um telespectador desatento deixa de perceber.

Um microondas assassino?

A trama é surreal e conta a história de Donald, um trabalhador braçal insatisfeito com sua vida e casamento, que após matar a esposa num surto de raiva, decide guardar o cadáver na geladeira. Porém, ao mais tarde confundi-lo com comida, acaba se tornando um canibal homicida que seduz mulheres a fim de devorá-las, metafórica e literalmente.

Se o microondas não mata, por que se chama “O massacre do microondas”, ora?


A questão é bem interessante. Ao contar a história de um assassino o filme esconde um fundo crítico que não é de se desprezar. Trata-se de uma metáfora a respeito da possibilidade de satisfação no mundo contemporâneo. Donald, antes de ser um canibal homicida, é mais uma pessoa insatisfeita cercada por todas as promessas de felicidade dos anúncios publicitários: geladeiras, televisores, quitutes e (como não poderia deixar de ser) microondas. Preso num universo insípido, ele tem que responder a rituais cotidianos sem sentido - o trabalho chato, os jantares desgostosos com a esposa - e viver uma vida da qual não retira qualquer satisfação. Sua solução é beber até cair e tentar compartilhar algo com outros, o que nunca dá certo. Até que num surto ébrio de raiva, acaba matando a esposa e experimenta o gosto de seu cadáver. No entanto, o ato de provar o proibido, de degustar um vício que vai contra todos os valores o que guiavam até então, não faz com que o personagem sinta nojo de sua ação, mas que a incorpore como um novo hábito. A partir dali ele abandona o seu antigo eu, substituindo-o pelas novas facetas que descobre nas mulheres que mata e nas... Iguarias que experimenta. 

Sutilmente o diretor constrói um fiel retrato do homem burguês, aqui pintado a base de sangue e saliva. O filme trabalha, por um lado, com a perspectiva da vida levada pela sujeição à conjuntura e, por outro, pela abertura ao vício como maneira de insubmissão a isso. Somente quando Donald abandona o mundo dos carnês, da falta de sexo, do almoço requentado no microondas é que vai reencontrando o prazer por estar vivo... E assim se explica o título. Podemos, então, colocar à questão: é possível que o vício seja uma alternativa à vida medíocre? A contemporaneidade parece sugerir um sim, afinal, a fluoxetina, a maconha, a infidelidade e os escapismos habituais estão aí para ficar, independentemente das tentativas de combatê-los com auto-ajuda, polícia e moral. Por outro lado, o filme diz que não: no final o protagonista é apunhalado por aquilo mesmo que desperta o seu prazer. Sinceramente, não sei. Digam-me vocês.

Essas paradas que você falou aí, mano... Então eu tenho que vê a bagaça?

Consideradas essas questões eu não quero de modo algum passar a impressão de que o filme seja minimamente bom. Ele é muito ruim. É possível enumerar ao infinito as críticas cabíveis a ele, portanto, só farei três (que, entretanto, permeiam a obra toda):

Machista pra caramba!
 
Para começar, as mulheres são retratadas a partir dos preconceitos usuais, seja como objetos sexuais quando jovens ou como pessoas ridículas quando envelhecem. Isso está bem expresso logo na primeira cena: um close nos seios e bunda de uma loira com ares de universitária que paga mensalidades com programas. A esposa do protagonista é uma megera caricata que, por mais que tente, já não agrada mais o marido. Não se coloca em questão que o próprio protagonista é feio, desajeitado e não se esforça para ser de qualquer maneira que seja mais agradável a esposa. A responsabilidade, afinal, é sempre da mulher.

Atuações caricatas!
 
     Quanto às atuações e a colocação dos personagens em cena, o filme lembra programas de humor populares (tão comuns a nós brasileiros) de comédia pastelão vulgar, como “Zorra total”, “Os trapalhões”, “A praça é nossa” entre outros. Há piadas prontas, olhadela do protagonista para a câmera e recursos que teriam um sentido profundo nos filmes do Godard, mas que aqui não passam de bobagem para tentar fazer rir o telespectador.

Falta de conclusão para certos personagens (Spoilers)

O final é uma droga te faz pensar se a vida seria melhor se você não a desperdiçasse com filmes ruins, ficasse menos tempo na internet, praticasse mais exercícios e fosse vegetariano. Contudo, o pior de tudo é que não há conclusão para vários personagens. Por exemplo: participa de toda a história a figura da vizinha gostosa e promíscua. Dentro da trama sua existência faz todo o sentido: a loira é a antítese do protagonista, alguém livre das convenções que faz sua situação lhe dar o máximo de satisfação. E qual é o final da gostosa? Ela morre? Ela casa? Ela engravida? Respondo: nenhuma das alternativas! Ela não é morta, ela não fica com Donald e nem é mencionada quando os créditos começam a subir. A personagem é simplesmente ignorada e não tem nenhum final. E não é a única. Posso citar também a nora de Donald que descobre o hábito bizarro do genro e é trancada no armário. Que fim ela tem? Ela morre no armário? Ela entrega o assassino à polícia? Ela dá cobertura a Donald? Respondo: não! Ela é descoberta meses depois da morte do protagonista... Presa no armário e ainda viva! Jesus...

Coisas que aprendi com “O massacre do microondas”


  • Que se você for um assassino e quiser desmaiar sua vítima, basta forçar um pedaço de pão dentro da boca da infeliz.
  • Que loiras gostosas são taradas por pedreiros e suas cantadas criativas.
  • Que com jeitinho sua esposa pode se acomodar dentro do microondas... De pé.
  • Que nos discursos que vemos TV ou em outros lugares o não-dito pode ser tão imundo e ofensivo quanto o que é dito explicitamente. Você discorda? Então vá à mer... seu filho.. da p...
  • Que qualquer gordo feio, baixinho e sem atrativos tem chance de se dar bem com as mulheres mesmo sendo pobre. Portanto: saia já da academia e vá à caça!
  • Que carne humana é (muito) melhor que Burger King
  • Que dizer “eu não diria isso para qualquer uma, mas você tem química” é a formula mágica do amor.
  • Que atores medíocres também tem sua vez, opa, essa eu já sabia - não é mesmo, Gianecchini?
  • Que cabeças decepadas tem lasers nos olhos.
  • E, por fim, que a tradução de “pussy, pussy, pussy” é “pela, pela, pela”.

Trailer




O meu julgamento sobre “O Massacre”, leitores, é que um filme que se anuncia como “o pior filme de horror de todos os tempos” definitivamente merece ser visto.

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