domingo, 24 de março de 2013

Resenha: Ovelhas assassinas (Black sheep)


Você gosta de animais? Eles são bonitinhos né? Mas... Já pensou se aquele bichinho que você sempre adorou se transformasse em um mutante assassino comedor de gente? Você ainda o amaria e defenderia?



Ovelhas assassinas
Nós, os bichos e nossa circunstância




Título original: Black Sheep
Lançamento: 2006 (Nova Zelândia)
Duração: 87 minutos
Direção: Jonathan King





Era uma vez uma ovelhinha que... MATOU TODO MUNDO



Henry, depois de 15 anos, retorna pra fazendo onde cresceu para vender sua parte da propriedade para o irmão Angus, entretanto, durante a estadia na sua velha casa, uma experiência genética acaba sendo libertada logo ali, transformando ovelhas bonitinhas em monstros assassinos que, ao morderem pessoas, fazem com que elas sofram mutações ovelhisticas.

Ovelhofobia

Assim como muitos filmes, Black Sheep começa mostrando um pouco da infância do personagem com o objetivo de justificar certas coisas que serão melhor desenvolvidas do decorrer da história.
Os irmãos nasceram numa fazenda e o caçula Henry levava mais jeito com o trabalho e, consequentemente, mais atenção do pai, algo que causava um pouco de ciúmes em Angus. Certo dia, com raiva do irmão mais novo, o primogênito mata sua ovelha para assustá-lo, além disso, logo em seguida, ambos recebem a noticia que seu pai sofreu um acidente e morreu. Ambos os incidentes acabam produzindo um imenso efeito psicológico em Henry, traumatizando-o de tal maneira que ele desenvolve fobia de ovelhas.

Quinze anos depois, Henry precisa voltar para a fazenda para vender sua parte das terras para seu irmão, entretanto, ele não sabe que o rapaz contratou dois cientistas para fazer experiências genéticas com ovelhas com o objetivo de conseguir espécimes perfeitos. Apesar disso, nem mesmo Angus sabe que os cientistas não querem apenas criar ovelhas perfeitas, mas algo mais que isso.

Para piorar, no meio desse conflito todo, sabendo que o proprietário da fazenda anda fazendo testes com animais, dois jovens protetores dos animais e do meio-ambiente invadem a fazenda com objetivo de roubar algo ou tirar alguma foto e provar os crimes que acontecem ali, no entanto, ao tentar roubar uma capsula, acabam deixando que ela caia e se quebre, liberando um pequeno protótipo de ovelha assassina que sai espalhando psicopatia para as outras e transformando os homens em “ovelhomens”.

Eco-chatos

Uma das grandes ironias que percebo no filme é que toda a merda começa por culpa de dois jovens que querem salvar os animais e o meio-ambiente, ou seja, aqueles que tentam salvar são os mesmo que espalham todo o problema. Calma, calma, não criemos pânico! Não estou dizendo que não devamos proteger os animais, ou que são bacanas aqueles testes tenebrosos que existem por aí, nem nada disso, mesmo porque a merda já estava acontecendo por debaixo dos panos e a qualquer momento iria de encontro ao ventilador, os jovens só a anteciparam. Apesar disso, por melhor que fossem suas intenções, não podemos tirar a responsabilidade deles. O que quero dizer é que por melhor que a intenção seja, é preciso refletir sobre os atos, se organizar e encontrar os melhores meios para agir, não apenas se achar o superman e sair por ai salvando o mundo, porque por mais “certo” que você possa estar e por melhor que seja a sua causa você ainda é o responsável por suas ações e as consequências delas.
Vamos pensar no caso do filme: dois jovens no auge da sua rebeldia e utopia decidem brincar de super-herois e salvar os animais indefesos do tirano dono da maior fazenda da região - qual a chance disso dar certo?
Desculpe meu pessimismo e minha mania de destruir suas esperanças de um mundo colorido com unicórnios, arco-íris e purpurina, mas isso NUNCA vai dar certo, além disso, você se converterá facilmente no vilão da historia.
Quer dizer que devo ficar em casa vendo os animaizinhos morrendo e não fazer nada? Não, mas não seria mais inteligente tentar reunir uma quantidade maior de gente e tentar tomar atitudes legais ao invés de sair por aí invadindo propriedades alheias sozinho?
Claro é admirável que haja quem lute por causas em que acreditam ao invés de, sei lá, fazer um blogue mequetrefe sobre cinema trash e sentar confortavelmente em seus privilégios sociais, só que alguns desse idealistas acabam deixando que sua causa os domine, alienando-se do que estão fazendo e se colocando no mesmo nível daqueles que criticam. No filme, Grant (o jovem ecochato) liberta por acidente a ovelha infectada que o morde e transforma em um ovelhomem. É como se ele estivesse sendo possuído pela própria causa, deixando de pensar como um ser humano para virar o animal que desejava emancipar.
O filme acaba fazendo uma critica a esses ativistas que aderem a uma causa por moda ou só pra ter algo com que se revoltar. Não vemos discursos concretos e embasados; todos os argumentos utilizados são aqueles que já estamos acostumados a escutar: coitadinho do animal, a mãe natureza, equilíbrio, sustentabilidade, porco fascista e bla bla bla. Não há também espaço para a opinião do outro, sendo que, em certa passagem, Henry revela a Experience (a outra jovem ativista) que é irmão de Angus e, logo em seguida, ela já passa a julga-lo (“Por isso mesmo que tinha percebido uma aura egoísta em você”) embora ele não soubesse nada a respeito do que está acontecendo ali. Sendo assim, podemos ver até certo duplo sentido no nome da garota, “Experience”, ela é ingênua e só sabe repetir os mesmos discursos que todo mundo fala.
Se pessoas que não se manifestam são alienadas, será que aquelas que se manifestam, de certa forma, não acabam sendo também? Particularmente, creio que existe alienação dentro e fora do ativismo, não é porque você invadiu uma fazenda para salvar animais que será mais ou menos consciência que qualquer outro. Inclusive, talvez, nesse caso, esteja se manifestando mais por desejar algum reconhecimento que por uma convicção própria, como no filme que fica claro que a Experience está ali só porque foi convencida por outro personagem.
O que quero dizer é o seguinte: não sejamos ingênuos e acreditemos que as pessoas vão mudar sua relação confortável com os animais só porque algumas pessoas fazem protesto e dizem que é errado. Devemos pensar nas pessoas, no sentido de que elas são responsáveis pelo que elas fazem, ou seja, ficar falando o quão bonitinho é o animal, que não foram feitos pra comer, que carne é assassinato não vai resolver problemas, o que as pessoas deveriam fazer de fato é lutar por melhores tratamentos, criação e condições as quais os animais são submetidos.

Ovelhas malditas


Uma questão interessante que o filme nos coloca é: até que ponto nós queremos ajudar os animais. Já discutimos algo semelhante em “Cannibal Holocaust” e “Night of the lepus”, aliás, mas em resumo é o seguinte: ainda que os jovens pareçam super engajados em tentar salvar as ovelhas da mão de Angus, posteriormente, embora continuem mantendo os mesmos discurso quando os bichos se tornam psicopatas, notamos nitidamente que mudaram suas atitudes em relação a eles. Experience, por exemplo, quando vê que os animais não são mais tão bonitinhos quanto aparentam, deixa de interferir quando é necessário matar algum e até comemora quando atropela uma ovelha. Sua atitude para com o animal muda de acordo com a situação: ela o defende quando ele é indefeso, porém, a partir do momento em que ele pode interferir em sua vida, a porra fica seria. Algo bastante hipócrita, lógico. Se for para defender os bichos, que seja independente da situação e não somente quando lhe é conveniente.
É a mesma coisa que ficar postando no facebook fotos pra ajudar cachorrinhos e gatinhos, todavia, quando aparece um rato em casa é a primeira pessoa a dar uma vassourada - ambos não são animais? Ambos não merecem o mesmo direito? Ou mesmo em relação a outras questões como a alimentação, que já discutimos aqui: matar vacas, porcos e galinhas é totalmente aceitável, mas quando alguém mata algum animal diferente para comer é automaticamente crucificado em praça pública. Não é estranho? Por isso, se você protege os animais, seja coerente: não critique os chineses que comem cachorro enquanto você tá aí com um pedaço de costela no prato.

Homens, animais e direitos


A principal discussão de Black Sheep é sobre a ética com os animais, todo o problema gira em torno dos testes com as ovelhas, então, podemos nos questionar se eles são aceitáveis ou não. Para os jovens não; para o fazendeiro sim. Será que algum deles está certo?
Eu responderia o seguinte: depende.
No filme, Angus (só abrindo um parênteses, Angus também é o nome de um dos melhores tipos de carnes de boi, e, por acaso, trata-se de uma raça de boi que vem sendo modificada geneticamente desde 1800) faz algo que pode ser considerado o seu argumento a favor da manipulação dos animais: contrata alguns cientistas para que façam testes genéticos nos bichos e assim consigam ovelhas melhores, ou seja, com melhor lã. Como ele mesmo diz: “melhor pra mim, melhor pro fabricante, melhor pro consumidor”, quer dizer, todo mundo sai ganhando... Menos a ovelha. No fundo, o argumento é o seguinte: manipulamos os animais para nosso próprio benefício, por isso, intervir na natureza deles é aceitável já que saímos no “lucro”. Se, além disso, aceitarmos também o princípio de que aquilo que é bom para o coletivo (a sociedade) é melhor que o que é bom apenas para um (a pobre da ovelha), acataremos facilmente o argumento de Angus.
Se olhado de perto, no entanto, veremos que esse argumento obedece um critério puramente prático, em outras palavras, ele nos diz que ganhamos benefícios sociais se escolhermos agir como ele deseja e que, por isso, devemos agir como ele deseja. Qual o problema nisso? Bom, para responder isso precisamos entrar no campo dos valores pessoais, isto é, da moral. Se você acha que “buscar o bem da sociedade” é um critério aceitável (sozinho) para mediar nossa relação com os animais, provavelmente concordará com o fazendeiro; contudo, caso creia que isso não é só o que vale, acabará discordando dele.
Tanto num caso como no outro nos debatemos com alguns fatos inconvenientes: manipular os bichos, matá-los, abrir seus crânios vivos para estudar medulas no interior de seus cérebros, comer seus corações no churrasco, suas peles no almoço, vendê-los em lanches para as crianças, tudo isso é muito bom para nossa vida prática: produz alimentos, remédios e tantas outras coisas de que dependem nosso cotidiano e conforto; todavia, em qualquer um desses casos, embora seja grande o benefício que traz, não podemos deixar de notar que se trata de um imenso abuso de nossa parte que submete os bichinhos, por serem indefesos diante de nosso poder, a relações bárbaras as quais não achamos aceitáveis de se ter com outros humanos. Fazemos indiscriminadamente com os bichos aquilo que consideraríamos horroroso praticar com seres humanos; eles estão apartados de nossas caríssimas relações morais.


Por mais que você ame os animais e os defenda, temos que ter consciência que nossa relação com eles sempre foi e, provavelmente, sempre será uma relação de força e submissão. Não importa se você não come carne, se você ama seu cachorro como um filho, sua relação com ele querendo ou não é uma relação de força. Ele depende de você para comer, você o tranca, coloca coleiras, entre outras coisas, ou seja, você impõe sua vontade sobre a dele.
Tá, eu sei que você só aguentou esse meu trololó porque quer saber se eu apoio jogar uma deliciosa lagosta viva na panela. Ok. Já vou dizer.
Minha opinião é a seguinte: precisamos ter uma ética com os animais que independa do “uso” que damos a eles (alimentação, testes, criação) e tudo aquilo que vá contra isso deveria produzir alguma punição (para nós, claro), em outras palavras, acho que devemos primeiro estabelecer o que pensamos sobre os bichos, o que podemos ou não fazer com eles e por eles e, depois, só depois, tentarmos conciliar nossas questões práticas com essa moral.

Devo fazer experiências genéticas com uma ovelha?

Sim, afinal quem não quer virar um ovelhomem? Lobisomem é muito mainstream.
Ovelhas assassinas segue a mesma linha de filmes de zumbis, mas com ovelhas no lugar dos devoradres de cérebros. É um trash super bem feito e divertido. Aliás, seus efeitos especiais foram feitos pela Weta, a mesma que fez os efeitos de Senhor dos anéis.
O filme que consegue mesclar cenas bizarras com cenas bucólicas, campos abertos, ovelhas e trilha sonora muito bem feita. Temos cenas de transformação homemXovelha, ovelhas devorando cadáveres, massacrando um grupo de executivos, zoofilia, sangue, tripas e tudo aquilo que adoramos.
Melhor dizendo, eis um filme obrigatório para todos os fãs do gênero, que consegue trazer um pouco das bizarrices dos anos 80 em uma época carente pro-gênero.

Trailer:


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