terça-feira, 7 de junho de 2016

HQs: Sandman - Prelúdios e Noturnos


           Hoje o Café com Tripas sai da realidade e vai para o mundo onírico bater um papo com o responsável por todos aqueles sonhos bizarros que temos – ir pelado pra escola, cair de um lugar desconhecido, ser perseguido por um dinossauro, fazer lascividades com seus amiguinhos/as, lutar ou ser morto pelo Freddy Krueger, enfim... – isso mesmo, estamos falando daquele que tem vários nomes: Sonho, Morpheus, Sandman...
            Feche os olhos e venha tomar um Café no império do sonhar.



            “Lúcifer: Com ou sem elmo, você não tem poder aqui. Que poder tem os sonhos no inferno?
            Sandman: Você afirma que não tenho poder? Talvez seja verdade… Mas… também diz que sonhos não tem poder aqui? Diga-me, Lúcifer Estrela da Manhã… Indague-se… Na verdade, indaguem-se todos vocês… Que poder o inferno teria se aqueles aqui confinados não fossem capazes de sonhar com o Paraíso?

Titulo original: Sandman 
– Preludes & Nocturnes (1-8)
Autor: Neil Gaiman
Ano: 1989
Lido em: Sandman – Edição definitiva #1
Editora: Panini (Dc Comics)
            Roderick Burguess é um bruxo que, após conseguir reunir todos os artefatos necessários, inicia um ritual para a invocação da Morte, com o intuito de aprisioná-la e ter total controle sobre suas ações. Mas algo sai errado e ele acaba invocando e aprisionando seu irmão, o Sonho. O confinamento faz com que o mundo dos sonhos começasse a ruir, levando diversas pessoas ao redor do mundo a pegar a doença do sono. Essa prisão dura cerca de 70 anos, quando consegue se libertar ele percebe que os seus amuletos, utilizados para gerir o mundo dos sonhos, foram roubados. Isso faz com que Sonho comece uma busca pelas suas ferramentas.

O mundo dos sonhos

            Em Sandman, vamos acompanhar o Sonho (ou Sandman, ou Morfeus…), ele é o perpétuo responsável pelo reino do sonhar, sendo assim, neste primeiro arco composto pelas primeiras 8 edições, teremos um foco maior na apresentação do personagem e no desenvolvimento de uma trama capaz de mostrar o personagem em ação ao mesmo tempo em que cria estruturas para futuras historias. Neste arco temos uma história relativamente simples e sem grandes surpresas, o sonho indo atrás de seus instrumentos, mas a simplicidade da historia é recompensada pelo desenvolvimento e complexidade desse universo criado pelo Gaiman.
            Durante a jornada do Sonho atrás de seus artefatos, ele passará por diversos lugares e personagens que muitos já conhecem: Inferno, Asilo Arkham, John Constantine, liga da justiça, entre outros. A história mostra diversas faces do personagem, pois, mesmo sendo a personificação de algo abstrato, o Sonho se mostra como um ser que, assim como os humanos, compartilha dessas características mundanas, como raiva, tristeza, solidão, entre outros que acabam sendo o ponto alto do quadrinho, pelo menos nessas primeiras edições.
            Gaiman cria um universo que se apropria do conteúdo de diversas fontes, como religião, mitologia e coisas assim, criando a partir disso algo original e brincando com essas coisas a partir de detalhes que ele coloca na história, que, caso vocês não fiquem atentos, podem até passar despercebido para alguns leitores.

Entre o sonhar e a realidade

            Ao meu ver, a trama central desse primeiro arco é a importância do sonho na vida das pessoas, tanto que será um tema recorrente em quase todas as histórias dessa primeira parte. A primeira delas já começa com o protagonista sendo aprisionado no ano de 1916, durante metade da primeira guerra mundial, sendo que ele só será liberto no fim dos anos 80.
            Tematicamente, a prisão do Sonho funciona como uma forma de justificar todas as desgraças que ocorreram no século XX, transformando-o num período de desesperança devido a série de acontecimentos que o assolaram: 1a GM, Quebra da bolsa, 2a GM, Guerra fria, Guerra do Vietnan, Ditaduras, etc. No período entre a prisão e a liberdade do Sonho, alguns personagens  serão apresentados para mostrar as conseqüência dessa prisão, bem como a sua libertação também repercutirá na vida dessas e de outras pessoas.
            Além disso, em cada edição em que Sandman vai atrás de suas ferramentas, percebemos uma característica do sonho, que mesmo sendo apresentado de maneira surreal e fantástica nos quadrinhos, pode ser facilmente interpretada e aplicada na realidade.
            Por exemplo: quando ele vai atrás da algibeira vemos uma personagem que fica viciada em sonhar, e isso faz com que ela acabe presa em seu próprio mundo e esqueça da realidade.  No inferno, por sua vez, o sonho acaba tendo uma função ambígua, pois assim como pode nutrir a esperança dos condenados, ele também pode servir como um instrumento de manutenção do sofrimento ao especular um sonho inatingível que os impeçam de aceitar sua condição. Por fim,vemos também a historia do Dr. Destino que manipula as pessoas a partir dos seus sonhos, levando as mesmas a cometerem atos inesperados. Esses são apenas alguns exemplos de como o sonho se manifesta de maneiras diferentes ao longo da história. O mais interessante a respeito disso é perceber as mudanças que essas temáticas geram na própria arte da HQ que, apesar de seguir um padrão de desenho, vez ou outra é quebrada de acordo com os acontecimentos. De igual modo, a aparência do próprio Sandman pode ser vista de maneiras diferentes de acordo com os personagens, uma vez que o sonho é abstrato e passível de interpretação.

Devemos sonhar?

            Preludios e Noturnos é a historia que abre a longa história do Sonho. A primeira vista, ela pode parecer bem simples: temos um personagem que vai em busca de objetos perdidos. No entanto, a partir do momento que paramos para para refletir sobre a narrativa, as imagens e os personagens, tudo começa a tomar forma e construir um mundo único e complexo. Um exemplo disso é a ultima historia desse arco, na qual o Sonho encontra a sua irmã, a Morte, e levanta uma serie de reflexões bacanas de uma maneira humorada. Ali Neil Gaiman consegue brincar com temas sérios sem grandes textos teóricos, apenas usando imagens e pequenos balões de texto.
            Apesar de tudo, mesmo sendo bom, o primeiro arco me deixou a sensação de que algo está faltando, contudo, por ser uma introdução ao universo e ao personagem é totalmente compreensível que Prelúdios e Noturno seja assim.

            Resumindo: Sandman é um quadrinho obrigatório, até mesmo pra quem não se interessa muito por HQs. Leia. Sonhe.

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