Hoje o Café volta a dar continuidade ao projeto #12MesesDePoe,
deixando de lado a fantasia e o sobrenatural, o senhor bigodinho, no conto de
hoje, vai nos provar que tamanho não é documento, o que importa é o jeitinho
que você usa suas habilidades.
“Jamais
conheci alguém que fosse tão vivamente dado a brincadeiras como o rei.
Parecia viver
apenas para troças. Contar uma boa história do gênero jocoso, e contá-la bem,
era o caminho mais seguro para ganhar-lhe as boas graças. Por isso acontecia
que seus sete ministros eram todos notáveis por sua perícia na arte da
pilhéria. Todos se pareciam com o rei, também, por serem grandes, corpulentos e
gordos, bem como inimitáveis farsistas. Se é a brincadeira que faz engordar ou
se há algo na própria gordura que predispõe à pilhéria, nunca fui capaz de
determiná-lo totalmente, mas o certo é que um trocista magro é uma rara avis in
terris.”
Titulo
original: Hop-Frog
Autor: Edgar Allan Poe
Ano: 1849
Paginas: 7
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Hop-Frog e Tripetta, são anões que
foram sequestrados de sua terra natal para serem oferecidos de presente para um
Rei. Hop-Frog além de anão também era manco, característica que lhe rendeu esse
nome, isso fez com que servisse de bobo para o rei e para os sete membros do
conselho, assim como Tripetta que, por ser uma ótima dançarina, também tinha
como função entreter seus senhores. Quando o rei decide dar uma festa e pede
conselhos de fantasias para o seu pequeno servo, o bobo vê a oportunidade
perfeita para se vingar.
Reis & Servos
Hop-frog é uma história simples, mas
que dentro de seu curto espaço discute bem a questão do poder, seja o do rei,
que detém de riqueza e influência, seja daqueles que se mostram mais
inteligentes.
Nos primeiros parágrafos somos
apresentados a um rei que tem como grande característica o seu gosto pelas
brincadeiras e piadas, o que faz com que leitor crie certa simpatia por ele no
início. Mas é só avançarmos um pouco na leitura que esse humor do rei se mostra
um tanto deturpado e inconsequente, já que ele está interessado apenas no
próprio entretenimento, sem se preocupar com os custos e com os danos que possa
causar. Isso fica aparente quando os anões surgem na história porque, apesar do
rei ser uma pessoa que quer estar sempre rindo e fazendo brincadeiras, ele não
se importa em ter servos em condições precárias ou mesmo em maltratar e caçoar
da deficiência alheia, algo que por sua vez levanta a questão sobre o limite do
humor, mostrando que uma piada pode ser consequência de muito sofrimento.
Outro ponto que aprofunda essa
questão do riso a partir da dor alheia é que tanto o rei quanto seus ministros
são descritos como pessoas feias, sem muita educação e sem muita inteligência,
apesar de serem considerados bonitos em seu reino. Reflete-se assim a
hipocrisia do monarca que tira sarro do outro sem perceber os próprios defeitos
porque está protegido pelo poder, que o torna capaz de legitimar sua
repugnância. Apesar do poder criar sua beleza, contudo, ele não compensa a
falta de inteligência: a fantasia designada para o rei e seus conselheiros no
final do conto não parece mera coincidência.
Narrador?
Algo que deixou intrigado durante o
conto foi seu estilo narrativo, pois apesar dele parecer uma narrativa em
terceira pessoa, em alguns momentos me perguntei se na verdade não seria
primeira. Por ser um narrador desconhecido, uma das poucas coisas que é
possível supor sobre a seu respeito é que ele é contemporâneo à história por
falar frases como: “Nosso rei” e “Jamais conheci alguém que fosse tão vivamente
dado a brincadeiras como o rei”. Ao dizer frases assim ele suscita dúvidas no leitor,
pois o modo pelo qual eventos são contados geralmente dá a entender que o
narrador é onisciente, já que ele sabe não apenas o que houve na festa como
também os acontecimentos que ocorreram no gabinete do rei. É possível supor
então que quem está nos contatando a história seja na verdade o próprio
Hop-Frog ou a Tripetta, porque apenas eles estavam presentes. Mas existe ainda
outra possibilidade: o narrador pode estar supondo os acontecimentos da sala do
rei a partir do que houve na festa, tornando-o um narrador não confiável. Ou
pode ser o próprio Poe se colocando como narrador da sua criação.
O anão PoeRneta
Neste conto, Poe adota uma narrativa
mais realista e linear, sem apelar para o sobrenatural ou questões filosóficas
e psicológicas. Mesmo sendo um sobre vingança, tema já saturado na literatura,
ele consegue se manter diferente de todo o resto, conseguindo gerar a dúvida
sobre a origem do narrador mesmo em uma história que parece fechada, assim como
tratar de temas ainda relevantes. Apesar de não ser um conto muito conhecido de
Poe, Hop-Frog mostra que mesmo os menos celebrados merecem ser lidos.
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