terça-feira, 1 de agosto de 2017

Literatura: O segredo dos corpos (Dr. Vincent Di Maio & Ron Franscell)


Você também tem esse desejo mórbido de saber mais sobre assuntos relacionados à morte? Adora assistir ou ler obras e matérias sobre assassinatos e mortes misteriosas? Sempre teve curiosidade e uma certa atração por medicina legal, mesmo não tendo coragem de se aproximar de um cadáver?
Então se aproxime da maca porque hoje é dia de autopsia, bebê!



“Nossas conclusões afetam mais os vivos que os mortos. Os mortos já não são objeto de preocupação, mas os vivos podem ir para a cadeia. Vidas podem ser salvas por causa de vírus e germes. Nossas conclusões podem provar a inocência de alguém. Perguntas podem ser respondidas, e suspeitas validadas. Portanto, médicos-legistas carregam o pesado fardo de chegar a conclusões cientificas, imparciais, baseadas em fatos, a despeito do que desejam os familiares, amigos, inimigos ou vizinho do morto. A verdade é sempre melhor do que aquilo que meramente desejamos ser verdade.”



Título original: Morgue:
A life in death
Autor: Dr. Vincent Di Maio &
Ron Franscell
Ano: 2016
Editora: Darkside books
Páginas: 281
            Vincent Di Maio é um médico-legista bastante reconhecido no meio, que trabalhou em importantes casos, desde a exumação do suposto assassino do presidente Kennedy, passando pela investigação sobre um crime racial que gerou bastante polemica nos EUA ou, até mesmo, servindo de consultor sobre uma pesquisa que tinha o objetivo de compreender melhor a historia por trás do suicídio de Van Gogh.
Depois de décadas trabalhando em meio a cadáveres, Di Maio conta uma pouco sobre sua profissão e sobre alguns casos emblemáticos de sua carreira. Além de mostrar um pouco sobre o processo de autopsia e exumação, ele também desmistifica muitas das lendas que rondam o assunto.

Olha, ele ta ficando roxo

A principio, O segredo dos corpos é um livro de casos, em que a cada capitulo os autores vão se dedicar a contar sobre um evento importante e/ou curioso vivenciado por Di Maio. Em meio a esses episódios, o legista vai fazer uma contextualização tanto daquele caso em especifico quanto da sua vida e da profissão, tornando o livro mais rico e esclarecedor.
Mesmo os casos sendo interessantes por si só, envolvendo mortes intrigantes difíceis de explicar, o livro, pelo menos pra mim, é muito mais atrativo por todo o contexto que é criado para tratar de cada morte em específico, não sendo apenas um compilado de mortes curiosas como um jogo do “Dark Stories”. Sendo assim, é como se os autores fizessem uma autopsia não apenas do morto, mas de tudo aquilo que rodeava aquela história.
A cada capítulo vamos ter um caso novo que os autores iniciam fazendo uma breve recapitulação do evento com fatos evidentes, como por exemplo o caso de um bebê que morreu com menos de um ano. Ele voltava regularmente ao hospital porque misteriosamente parava de respirar, mas os exames não aparentavam nada de errado e durante as observações no hospital ele permanecia saudável e nenhum evento incomum, só quando voltava pra casa que isso ocorria. A partir disso, o livro segue dois caminhos, o de investigação e o de legista.
A princípio, os autores vão contextualizar o caso mostrando o passado da família, as investigações que foram feitas para identificar o problema, como a verificação do ar da região pra ver se o problema não estava ali, etc. Feito isso, eles mostram um pouco do processo empregado pelo legista para identificar a causa da morte, como os hematomas ou danos encontrados no corpo que comprovem ou desmintam alguma teoria. Por fim, com as provas apresentadas e com o caso solucionado, o livro mostra como aquilo se desenrolou, fazendo um breve apanhado do que houve no tribunal ou qualquer outro rumo que tenha tomado.
Entre um cadáver e outro, Di Maio vai pegando as brechas necessárias em cada caso para contar um pouco sobre sua vida e sobre a profissão, principalmente no contexto norte-americano.


Me passa o bisturi

Mais que a autopsia dos corpos e até mesmo as investigações, uma das coisas que mais me interessaram no livro foram algumas curiosidades que até então eu não sabia ou não tinha parado pra pensar. Como por exemplo os processos e as condições da medicina legal nos EUA.
Apesar da medicina legal gozar de bastante popularidade nas séries de TV, no livro vamos descobrir que na realidade as coisas são bem diferentes no mundo dos legistas, pois se trata de uma área que não tem tanta procura e muitas das pessoas que acabam decidindo exercer a profissão, abandonam logo depois. Isso acontece por diversos fatores, mas principalmente por ser uma das áreas menos remuneradas da medicina e por ter que lidar com eventos e situações nem um pouco agradáveis.
Como consequência disso vamos ter o problema de ter muito menos legistas do que o necessário, algo que gera um problema bem curioso nos Estados Unidos. A medicina legal acaba sendo um luxo das grandes cidades, enquanto nas menores acaba existindo um costume que eu achei um tanto bizarro (algo que não é exclusivo dos EUA): na falta de um legista na região, há uma pessoa que é escolhida para ser o responsável para “diagnosticar” a causa da morte, entretanto não há nenhum pré-requisito que não seja a maior idade. Como você deve imaginar, isso causa um problema porque pessoas nem um pouco aptas são responsáveis por fazer esse trabalho que envolve diversos fatores e geram diversas consequências. Então, como o próprio Di Maio acaba falando em certo momento, esse tipo de pratica que não envolve a experiência necessária acaba fazendo com que crimes fiquem sem solução (ou seja julgado erroneamente) e algumas doenças que poderiam ser evitadas com uma autopsia correta acabam não sendo identificadas e se perpetuando naqueles que continuam vivos.
Então o livro acaba permitindo que o leitor tenha um visão menos hollywoodiana da profissão e passe a compreender melhor o contexto e as atividades exercidas pelo legista. Mesmo relatando todos os problemas, o livro não deixa de fazer com que o leitor se interesse ainda mais pelo assunto e comece a ficar desconfiado de certos eventos, como ele faz no final do livro.


Será que foi só a orelha?

No final de O segredo dos corpos tem um capítulo bem interessante que se diferencia um pouco dos outros, sem deixar o tema central de lado, em que Di Maio vai contar que ele foi convidado a ajudar em uma pesquisa sobre o Van Gogh, mais especificamente sobre os mistérios que envolvem sua morte. Isso é bem bacana porque essa “autopsia” ele só pode fazer a partir das histórias e dos relatos guardados e não tem um corpo para fazer todos os procedimentos de costume, algo que complica a situação e o impossibilita de chegar a um veredicto final, mas não deixa de ser bem curioso porque cria mais complexidade sobre o mistério.
Se você não sabe, é senso comum de que a morte de Van Gogh foi suicídio. Os relatos dizem que um certo dia ele saiu como de costume da pousada onde morava, levando os materiais de pintura, mas voltou horas depois sangrando na região do peito por causa de um tiro que ele diz ter disparado contra si. Devido a complicações ele acabou morrendo no dia seguinte.
Apesar dessa versão ser aceita por grande parte das pessoas, a história e o relato do legista que fez a autopsia de Van Gogh possuem algumas incongruências que mostram que a história pode não ter sido bem assim, seja pela marca da bala descrita pela autopsia, a posição da arma, etc. Não vou me prender muito nisso porque o bacana é você acompanhar todo o processo lógico do Di Maio em que ele vai apontando as divergências e mostrando outras hipóteses e teorias que fariam mais sentido de acordo com aqueles dados disponíveis.


Legal, tudo que eu precisava pra sair dissecando umas pessoas por aí

            O segredo dos corpos é um livro pra todos aqueles que se interessam por medicina legal e/ou adoram assistir séries policiais que envolvem investigações e autopsias para desvendar o caso. Apesar de ser um livro de não-ficção, escrito por um médico, ele é bastante acessível pra quem é leigo no assunto (como eu).
Trazendo um caso diferente a cada capítulo, o livro consegue ser bem dinâmico e interessante. Ao mesmo tempo em que ele instiga o leitor com aquela determinada investigação, o autor também conta um pouco de sua história e apresenta as informações necessárias para contextualizar aquele ambiente. A todo momento o livro está te deixando curioso com algum mistério envolvendo a morte de uma pessoa e te passando um pouco de informações sobre aquele assunto.
O livro foi cedido pela Darkside em parceria com o blog. Além das características já conhecidas por nós, o livro também conta com algumas imagens envolvendo os casos e complementando o material. Mas pode ficar tranquilo que não há imagens de autopsias nem nada, não precisa ficar com medo de gorfar na sua edição.

Que o cadáver seja aberto.

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